quarta-feira, 15 de junho de 2011

Repetir, recriar, inovar... dançar


Acabo de passar algumas horas lendo sobre bailarinos, coreógrafos e movimentos  que marcaram a dança moderna e pós-moderna. Sobre as gerações que vieram desde as décadas 60 – anos estrondosos na vida política e cultural do planeta – passando pelos anos 70 e, finalmente, a vertiginosa quantidade de criações e experimentos mais livres – e menos de contestação – dos anos 1980. Estas últimas, que se multiplicam em quantidade até os dias de hoje.

Fazem parte destas gerações muitos nomes conhecidos e marcantes para a dança contemporânea. Alguns deles são Twyla Tharp, Meredith Monk, Trisha Brown, Karole Armitage, Carolyn Carlson, entre tantos outros.

Se revemos seus trabalhos e comparamos com a produção atual em dança, surpresa! Encontramos muitas características deles nas nossas criações do século XXI, em plena década de 2010! Como assim? Cópia? Ignorância? Repetição? Talvez sim, em parte não.

Creio que uma coisa é ter-se como objetivo a INOVAÇÃO. Difícil e raro. Mas pode-se também criar a partir de um leitmotiv que até mesmo quer ser explorado e desenvolvido. Assim se fazem as escolas, os estilos artísticos. Assim se delineiam as sensibilidades de uma época. Mas INOVAR e CRIAR requer muita pesquisa e trabalho árduo, além de talento.

Outra coisa é querer dançar todas essas coisas que já foram criadas e dançadas décadas atrás. Dançar mais uma vez, mais mil vezes. Para experimentá-las, porque são boas; para desenvolvê-las e divulgá-las; para manter sua memória. Isto também é válido, mas se estiver bem claro ESTE objetivo. E assim mantemos e desenvolvemos conhecimento e experiência. Talvez seja mesmo o primeiro passo para se ir adiante. Seria o início de uma pesquisa.

E quem sabe vivamos uma época em que aglutinamos, em nossas vivências e danças, toda a carga cultural das eras anteriores? Colocamos tudo isso em nossa centrífuga e... viveríamos, assim, a era dos museus?

quinta-feira, 2 de junho de 2011

As Vidas da Dança: Em socorro ao respeito. Respeito ao que? A quem?

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Em socorro ao respeito. Respeito ao que? A quem?


Semana passada nossa internet e nossos jornais foram invadidos pelo episódio inusitado dos rapazes – militares – que dançaram o hino nacional brasileiro. Quero falar sobre algumas questões que tangem o acontecido, e que não foram tocadas ainda.  

Dança é uma das práticas inatas ao ser humano e que, portanto, exercemos praticamente desde que existe nossa espécie. Porque é inata? Ora, pelo simples fato de o ser humano ser feito “de carne e osso”. Não somos um espírito, um ser transcendental. Somos nosso próprio corpo e seus movimentos. Assim sendo, a forma de vivermos e manifestarmos nossa vida é através do corpo.

Por isto, a dança foi e é – em suas expressões diversas – uma forma de manifestar louvor a deus ou aos deuses e à natureza. Da mesma maneira, a dança sempre foi um importante exercício de cuidado do nosso corpo, da vida. Aliás, cuidando de nosso corpo, cuidando de nós, louvamos aos deuses ou a vida.

De outra parte, como seres humanos, também temos outra atividade inata que é a criação de representações e símbolos que dão concretude, explicam e ilustram tudo o que somos e o mundo que nos cerca. “O homem é um animal simbólico”. Essas são as palavras de C. G. Jung, renomado psicólogo e psicanalista, colega e contemporâneo de S. Freud.  Hoje, mais do que suas palavras, este é um fato de reconhecimento geral.

Por isso tudo, concordo, sim, com a importância de respeitar, cuidar e, sobretudo, de compreender símbolos nacionais como a bandeira, brasão, hino. Porém gostaria de ressaltar que não só a bandeira e o hino de uma nação devem ser respeitados, mas em primeiro lugar a própria nação, suas vivências, seus cidadãos, sua cidadania. Afinal, se “a coisa” não existe mais, sua representação pode se tornar vazia. Alerta! Igualmente penso que não só os símbolos nacionais ou militares devem ser respeitados, mas também símbolos de outras instituições sociais ou, mesmo, os símbolos importantes a cada grupo e vivência social. E estão sendo respeitados todos?

Porém, a despeito de toda a simbologia, fiquei estupefata com o escândalo por parte dos militares diante dos garotos que dançaram, e com a lei de “respeito ao hino”. Como poderia a dança – que, como dissemos, é uma representação e vivência social nobre e inata ao ser humano – ser um sinal de DES-respeito ao hino nacional? Ora, não viria ela, assim como as outras artes, coroar a nossa pátria amada? No hino, a pátria é representada pela arte da música e da poesia. Na bandeira, é representada pela arte visual. E a dança, que é outra arte... onde fica?

Não defendo, de maneira alguma, a dança funk, nem as falsas artes. Muito pelo contrário. Não defendo também a intenção dos rapazes militares que dançaram o hino, pois esta eu desconheço. Mas defendo a boa dança. E questiono se o mundo não seria melhor se as pessoas dançassem mais e, particularmente, se os militares cantassem e dançassem... Será que não existe, neste manifesto dos garotos, a fala de uma necessidade de revisão de leis e instituições?

A mim parece haver nesta situação toda – e há muito tempo, na sociedade – uma grande contradição quanto ao cuidado e cultivo de símbolos. E este episódio dos militares e do hino dançado não se deu por acaso, pois o exército é uma das instituições em que a contradição de que falo é mais visível e gritante. Trata-se do cuidado de símbolos desconectado do cuidado do ser humano. Se defendo os símbolos e o respeito a eles, é porque símbolos são criados por e para o homem. Nunca o homem deve ficar à revelia de seus próprios símbolos ou instituições e leis. E nunca (!) devemos esquecer o cuidado do ser humano.

Se a bandeira deve ser idolatrada, salve, salve, e o hino tem música e poesia maravilhosas, também defendo a interatividade do ser humano com essas belas artes e símbolos que ele mesmo inventou. Mas claro, que ensinemos e aprendamos uma interatividade digna. E mais: defendo a dança, a arte com que o ser humano manifesta seu devir, sua existência, como parte legítima a ser acrescentada no Hino Nacional Brasileiro.